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“É preciso haver paixão pelo desporto”



Com que idade iniciaste a
prática competitiva do Taekwondo e onde?

Comecei
a praticar taekwondo com 6 anos, no ano de 2000, no antigo Clube do Ginásio
Koryo.

 

Achas que o taekwondo
ajudou no teu desenvolvimento enquanto indivíduo?

Sem
dúvida. O taekwondo ensina ao praticante o respeito, a disciplina, o controlo.
Características perfeitas para o crescimento do individuo. Sempre que posso
recomendo o taekwondo para os mais novos, pois mesmo que em casa a educação
deles seja diferente, dentro duma sala de taekwondo os princípios são impostos
e seguidos. Não só princípios para o crescimento do individuo me foram dados
pelo desporto, desde características físicas a características psicológicas, o
taekwondo ajuda a desenvolver tudo.

 

Qual foi o papel da tua
família no teu percurso enquanto atleta de alta competição?

A
minha família foi um dos elementos chave, sempre me apoiaram. Levantavam-me a
moral quando perdia e festejavam quando vencia… e porque o taekwondo não recebe
grandes apoios, a minha família tornou-se o meu “investidor”. Acima de tudo, a
minha família é o suporte
. Lembro-me
de um episódio, há uns anos atrás, em que nós tínhamos tido prova em Espanha, e
tínhamos ido numa carrinha com uma certa quilometragem, acabamos por ficar pelo
caminho, mas depois acabamos por chegar. À vinda, não havia transporte, era já
de noite, então recorremos aos nossos familiares, e umas horitas depois,
estavam eles prontos para nos levar para Portugal.

 

Quantas vezes treinas por
semana, e quanto tempo?

Treino
seis vezes por semana, cerca de 1h30min por treino.

 

Algumas pessoas associam as
artes marciais a comportamentos violentos. O que tens a dizer a essas pessoas?

Penso que cada vez mais as
artes marciais perdem esse “significado”. Todo o trabalho desenvolvido na arte
marcial tem como principal objectivo fazer com que o praticante se consiga
defender, mantendo a calma e sendo capaz de pensar, e prever no momento os
próximos ataques e contra-ataques. Aquele que conseguir ler adversário, irá
dominar. Acredito que futuramente, as artes marciais, possam ser vistas como
algo que faz uma pessoa crescer.

 

A maneira como tu lidas com
a pressão e a ansiedade antes dos combates é algo que tu consegues trabalhar e
treinar, ou simplesmente é algo com que apenas lidas na hora em que entras no
tatami?

A
pressão e a ansiedade são aspectos que podem ser treinados antes dos combates,
aliás, dias antes das provas. Existindo uma variedade de soluções para o atleta
controlar esses sentimentos.

 

Qual foi para ti o combate
mais difícil que tiveste até hoje?

Penso
que o combate mais difícil, e talvez o que mais experiência me trouxe, foi um
dos combates do Europeu de Juniores, contra um atleta da selecção Alemã. Entrei
um bocado intimidado pela altura do adversário, e sofri no primeiro round um
pontapé na cabeça. Apesar disto, a minha atitude mudou, eu estava lá para
vencer, queria no mínimo atingir o pódio, e pouco a pouco fui recuperando. Comecei
então a perceber que apenas a altura não viria a ser suficiente. O atleta não
tinha grandes recursos, não era rápido, nem era muito forte, apenas tinha uma
perna um pouco maior. Vim a vencer em morte súbita, com um pontapé numa
situação pouco comum, um Bandal Chagui 360 em contra, ou seja, basicamente um
rotativo a acabar de frente, enquanto me esquivava do ataque dele.

 

És atualmente Campeão
Nacional Sénior e Campeão Europeu Universitário. Qual é para ti a grande
diferença entre a competição federada e a competição universitária?

A competição federada,
permite o atleta atingir outros horizontes. Se vencer o Campeonato Nacional de
Seniores e se seleccionado, o atleta pode participar em provas como Europeus,
Mundiais, Opens, basicamente provas pontuáveis para o Ranking mundial, que
podem levar a uma qualificação para os Jogos Olímpicos.

A competição universitária
tem o facto de se restringir a alunos de universidades, e por isso, campeões
nacionais universitários, participam em provas universitárias. Devido a ser só
para um certo tipo de atleta o escalão perde em relação ao federado. Mas provas
são provas, seja qual for o escalão, deve-se sempre dar o melhor, e tentar
alcançar os objectivos estabelecidos.

 

Neste último Europeu
Universitário, que decorreu em Moscovo, conseguiste a medalha de ouro. Foi difícil?
Qual é a sensação de logo no teu primeiro europeu universitário conquistar algo
tão importante?

Penso
que nesse dia, estava focado, estava pronto, queria o ouro, e sabia que tinha
de ultrapassar alguns adversários mais difíceis. Então como já sabia o que me
esperava, contra esses atletas mais difíceis o meu nível de concentração foi
maior. O europeu foi-se tornando mais seguro.

É
muito bom conseguir tirar ouro na minha estreia no Europeu Universitário, mas
mais difícil será manter o título no próximo.

   

Sei que este não foi o teu
primeiro título europeu, pois já arrebataste o ouro no Europeu de Sub-21. Ainda
te recordas de como foi esse dia e o que significou para ti?

Foi
um muito especial, tínhamos tido o José Pedro no dia anterior a vencer a prova,
e no meu dia, estávamos eu e o Jean Michel a competir pela selecção. Pouco a
pouco começamos a passar as eliminatórias, e começamos a mostrar superioridade,
e quando chegamos á final, a dificuldade dos adversários estava num nível já
elevado, ainda assim eu fui primeiro, tirei o ouro, e de seguida o Michel
também tirou. Foi um dia de prova unicamente com vencedores portugueses no
sector masculino. Essas três medalhas de ouro fizeram a equipa masculina Campeã
Europeia de Sub-21, e vices no geral… uma prova para não esquecer.

 

Qual é o teu segredo para
tantos sucessos desportivos?

Acho
que é preciso haver paixão pelo desporto, gostar-se do que se faz nos treinos é
fundamental, mas prefiro combates a treinos, sejam eles de que tipo for. Digo
isto pois considero a que a maior arma do Taekwondo é a surpresa. Podemos ter
variadíssimos modos de combater, mas aquele que for sistemático em todos os
combates, acabará por vir a ser ultrapassado. É preciso estar sempre a evoluir
e a aprender, e como acho que a surpresa em mim, sai instintivamente, sinto que
adquiro cada vez mais conhecimento sobre a modalidade.

 

Os Jogos Olímpicos de 2016
são um sonho ou algo mais?

Dependendo de como correm
as próximas épocas pode ser um sonho ou não. Atingir os Jogos é cada vez mais
difícil, o nível do combate continua a subir, ou seja, acho que neste momento é
um sonho, mas com o evoluir das próximas épocas se pode vir a tornar algo mais.

 

O facto de competires e
pelo teu atual clube condicionou a tua escolha de Universidades quando
concorreste? Porquê?

Não
foi o meu clube que condicionou a entrada na Universidade do Minho. É verdade
que eu gostava de estar fora de Braga, mas se pudesse estudar e continuar a
treinar era a solução perfeita. Por isso a Universidade do Minho, e o meu clube
foram perfeitos para aquilo que eu queria. 

 

E
Arquitectura, o que te levou a escolher este curso? Está a correr tudo bem?

Escolhi
Arquitectura porque sempre tive jeito razoável para desenhar, e sempre fui
bastante criativo, não queria estudar algo que no futuro me pusesse num
trabalho sempre com a mesma rotina, e queria ter controlo sobre aquilo que
fazia. Apesar de apreciar o trabalho dos arquitectos, foi mais a maneira deles
trabalharam que me puxou para o curso.

Sim,
está a correr tudo bem, estou neste momento no segundo ano, e acho que não
seria possível sem a ajuda da Universidade do Minho e da Federação Portuguesa
de Taekwondo, que me ajuda na justificação de faltas, e na mudança de entregas.

 

Para muitos atletas de alta
competição torna-se difícil conciliar os estudos com a prática desportiva. Como
é que tu consegues gerir esta nem sempre fácil “relação”?

Eu não sou uma pessoa que
se preocupa muito, costumo deixar evoluir e sei que se tiver uma altura mais
apertada terei de começar a trabalhar mais arduamente mais cedo. Sei que se
trabalhasse sempre da mesma maneira, teria menos carga de trabalho em época de
entregas mas acho aborrecido trabalho contínuo sempre na mesma coisa, gosto de
projectar, fazer algo criativo, e resolver os problemas que os projectos têm,
mas se só fizesse isso acho que me tornaria eu uma pessoa muito aborrecida e
pouco social. Tal como disse acima, a Universidade do Minho e a Federação
ajudam nas faltas que dou quando estou em provas, e sempre que possível na
mudança das entregas de diferentes disciplinas.

 

A UMinho iniciou em
Portugal um programa pioneiro no que diz respeito ao apoio aos atletas de alta
competição, o TUTORUM. O que pensas desta iniciativa e do programa em si?

É
uma ideia fundamental para os atletas de alta competição. Ajuda-nos muito a
gerir o nosso tempo, e as nossas idas fora. Acho que se futuramente outras universidades
adoptarem este programa, o desporto universitário irá evoluir
significativamente em Portugal.

 

Já recebeste apoio através
do TUTORUM? Se sim, em que áreas?

Basicamente
foi nas áreas das faltas, e de entregas. Sempre educadamente e sabendo se os
professores estarão disponíveis ou não é combinado uma nova data de entrega.
Para as faltas uma simples justificação.

 

Os teus objetivos pessoais
passam por uma carreira profissional no taekwondo ou os estudos vêm em primeiro
lugar?

Porque não fazer as duas
coisas? Muitas pessoas saem do trabalho e vão para o ginásio, por isso eu vou
continuar a treinar enquanto conseguir, a única coisa que me pode vir a impedir
será a necessidade duma ida para fora do país na procura de um trabalho. Mas o
taekwondo não acaba nas nossas fronteiras, posso continuar a fazer aquilo que
fazia também fora quando fora do país. Tenho objectivos tanto para os meus
estudos como para a carreira de taekwondista. Sei que o taekwondo não recebe
muito apoio em Portugal, o que torna praticamente impossível viver só da
carreira profissional no taekwondo, se é que isso existe. Mas para ambos os
campos estabeleci objectivos, e pretendo conquistá-los.

 

Descreve-me um dia na vida
do Júlio

Levanto-me por volta das 7, apanho um
autocarro para depois apanhar a camioneta para Guimarães. Aulas às 9h horas até
às 13h, de seguida o almoço, tempo para confraternizar com os amigos e amigas.
De seguida, dependendo do horário, posso ter mais aulas, ou ter simplesmente de
ir continuar o trabalho de manhã. Às 17h, vou para casa, e entre as 17 e as 19
vou ao computador para trabalhar, de seguida preparo-me para ir para o treino.
Treino entre as 20:00 até às 21:30, e janto às 22 horas. Por volta das 22:30
tempo para ir ao computador, jogar, socializar e trabalhar. Por volta da meia-noite
deito-me e no dia seguinte repito.

 

Texto e Fotografia: Nuno Gonçalves


(Pub. Fev/2014)

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