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Qual a sua formação e trajeto académico?
Entrei na
Universidade do Minho em 1993, como estudante da Licenciatura em Engenharia de
Polímeros. Ainda a frequentar o 5º ano do curso, iniciei a lecionação de aulas
práticas de desenho e elementos de projeto, como Monitora. Em 1998 entrei na
carreira académica como Assistente Estagiária. Seguiu-se um Mestrado em
Matemática e Aplicações à Mecânica, na escola de Ciências da Universidade do
Minho, que terminei em 2001, findo o qual passei a Assistente. Finalmente, em
2004, conclui o Doutoramento na Universidade de Akron, nos Estados Unidos, na
área de Ciência e Engenharia de Polímeros. Regressei a Portugal nesse mesmo
ano, continuando na carreira docente como Professora Auxiliar.
Como caracteriza a sua função de diretora de
curso?
É uma
função polivalente que requer muita atenção, dedicação, entusiasmo e dinamismo!
A polivalência resulta do tratamento de diferentes assuntos que podem ser de gestão
pedagógica, académica ou pessoal. Portanto, caracterizo a minha função de
diretora de curso como um trabalho constante que requer imensa atenção para que
haja o funcionamento regular das atividades letivas em cada semestre e para que
todos os processos inerentes à direção de curso sejam executados cuidadosamente
e de forma expedita, como o tratamento de processos de equivalência, processos
de reestruturação de um curso ou de avaliação dos mesmos por entidades
externas. Para além destas funções, devemos garantir que (i) os alunos se
sintam apoiados, estejam motivados ao longo da sua formação e sejam
bem-sucedidos quando entrarem no mercado de trabalho; (ii) todos os docentes
colaborem e dinamizem o curso; (iii) o curso seja notado pela sociedade de modo
a cativar novos alunos a frequentarem o mesmo; (iv) o curso seja reconhecido pela
indústria, conseguindo assim a integração dos nossos alunos no mercado de
trabalho! É por
tudo isto um trabalho árduo e contínuo mas que se pode tornar muito
gratificante quando há um reconhecimento por parte dos alunos e se vê a
motivação e empenho destes na participação das atividades que são preparadas. Posso
dizer que os nossos alunos têm uma capacidade extraordinária? são
participativos, são dinâmicos e têm imensa energia, característica de jovens, que
devidamente explorada seria muito benéfica para a academia! Para
isso, todos sabemos (ou pelo menos aqueles que têm e já tiveram o papel de
diretor de curso), há que reconhecer e valorizar o papel fundamental de diretor
de curso, para que este se possa empenhar inteiramente nesta atividade.
O que a motivou a aceitar “comandar” este
curso?
Antes
de responder à questão que me é colocada, gostaria de esclarecer que o curso de
Engenharia de Materiais resulta da colaboração entre os Departamentos de
Engenharia de Polímeros e Mecânica da Escola de Engenharia e o Departamento de
Física, da Escola de Ciências. A gestão do curso é efetuada pelo Diretor de
Curso e elementos da Comissão Diretiva, composta por um docente de cada um dos
departamentos. Atualmente é composta por mim, o Prof. Carlos Tavares (Física) e
o Prof. Aníbal Guedes (Mecânica). Ainda há também a Comissão de Curso que é
composta pelos elementos da comissão diretiva e alargada a mais um docente de
cada um dos departamentos envolvidos e respetivos delegados de cada ano letivo.
A direção de curso é rotativa entre docentes do Departamento de Engenharia de
Polímeros e docentes do Departamento de Eng. Mecânica, sendo os mandatos de 2
anos. No mandato anterior (2010-2012), eu pertenci à comissão diretiva, pelo
que quando me foi proposto o cargo de diretor de curso do MIEMAT pelo Diretor
de Departamento de Engenharia de Polímeros, então o Doutor António Pontes,
aceitei com naturalidade e contentamento esse desafio. O que
me motivou aceitar comandar este curso foi acima de tudo uma nova experiência
em termos profissionais, pois trata-se de um cargo de gestão em que posso
participar e colaborar ativamente em prol dos estudantes e do curso. Para além
disso é um dever do professor universitário. Enquanto
elemento da comissão diretiva do curso em anos anteriores, constatei que a
minha atuação foi marginal e estava longe de conhecer o papel real do diretor
de curso. A minha primeira grande tarefa foi a escrita do Relatório de
Autoavaliação do curso (relatório escrito anualmente, que resume e avalia as
atividade letivas do ano anterior). Apesar de ficar apreensiva inicialmente,
considero que tenha sido um ótimo ponto de partida que me permitiu conhecer
completamente os pontos fracos e fortes do curso. A descoberta de que havia
tanto para fazer em Eng. de Materiais facilitou a elaboração de um plano de
ação para os dois anos seguintes (agora já na reta final), o que de si me
motivou ainda mais. Tem sido uma experiência muito positiva.
As experiencias anteriores têm-na ajudado no
cumprimento da sua função de diretora de curso?
Sim,
fundamentalmente porque a minha experiência como estudante, docente e
investigadora nesta casa permitiram conhecer toda a estrutura da universidade e
formalidades que devem ser seguidas para a execução dos processos burocráticos que
nos passam pelas mãos. Enquanto
aluna e docente fui aprendendo o papel de cada um e distinguir que é essencial
ter serenidade e bom senso na maioria dos casos que tratamos. Ao
estar quatro anos nos Estados Unidos pude tomar contacto com realidades e
mentalidades diferentes das nossas. Agora posso transmiti-las aos alunos e
recomendar que partam sem receios para experiências no estrangeiro, por
exemplo, em Erasmus, pois são bastante enriquecedoras. E há um momento para o
fazer, que é agora, enquanto ainda não têm muitos compromissos pessoais ou
profissionais! Para além disso permitiu-me constatar que o papel de diretor de
curso é decisivo para o sucesso do curso. Em Portugal temos que caminhar nesse
sentido pois os recursos estatais estão cada vez mais condicionados e é
fundamental os gestores académicos serem capazes de olhar e cativar outras
entidades nacionais e estrangeiras como forma de sustentabilidade dos cursos. Como
investigadora constatei que os nossos recursos humanos e laboratoriais são bons
ou até excelentes e por isso não admito críticas nesse sentido por parte dos
alunos. Devemos mostrar-lhe enquanto diretores que eles têm todas as condições
para estudar, investigar, praticar desporto e ainda de lazer, pois estamos
inseridos num campus com boas infraestruturas e com uma envolvente muito
natural e bela! Acho que não conseguimos reparar nisso porque nos mantemos
ocupados com tantas atividade do dia-a-dia que nos rodeia, mas é uma realidade.
Quais são as maiores dificuldades no
cumprimento da sua função?
A maior
dificuldade é a falta de reconhecimento pelo papel importantíssimo do diretor
de curso. Verifico que muitas das vezes o aluno não está no lugar devido das
nossas prioridades. Este facto é justificado com o acumular de vários cargos
(docente, investigador, gestor, empreendedor). Mas não nos podemos esquecer de
que o aluno é o objetivo maior para o sucesso desta universidade e que sem eles
não existimos como tal! O elo de ligação é o diretor de curso e por isso, é
essencial que se mantenham motivados e assumam com naturalidade este cargo. A outra
é a falta de verbas para executar mais atividades, por exemplo, de divulgação
do curso, de visitas a empresas, de apoio à preparação de seminários temáticos,
etc. A terceira é a agilização desta atividade com um conjunto de atividades
que são normais para um docente universitário e já de si bastante exigentes. Há
ainda o lado emotivo de um diretor de curso quando nos deparamos com alunos que
precisam da nossa ajuda, de Pais que nos ligam para obter informação sobre o
percurso dos filhos e saídas profissionais. Acho que não estamos preparados
para esta parte, com o contacto mais intimo com os nossos estudantes que por
vezes estão sedentos de apoio emocional. São histórias de vida que nos fazem
crescer e amadurecer todos os dias!
No seu entender, porque é que um futuro
universitário deve concorrer ao Mestrado Integrado em Engenharia de Materiais?
Acima
de tudo porque é um mestrado com saídas profissionais, com fácil integração
quer em atividades de investigação como em indústrias de alta tecnologia… porque é uma área estimulante e muito ativa em termos de desenvolvimento… porque corresponde a um domínio ainda emergente e muito importante em países
desenvolvidos e de grandes investimentos num futuro próximo. A área da
nanotecnologia ou biomateriais são mundos que ainda se estão a descobrir… porque é no desenvolvimento de novos materiais que suportamos o desenvolvimento
de novas tecnologias e novas aplicações cada vez mais aliciantes para o
utilizador. O que faríamos nós sem os nossos telemóveis, computadores ou
tabletes? Como foi possível a redução significativa de tamanho e peso destes
últimos? Eu fico muito grata por poder carregar todos os dias um computador que
pesa apenas 1kg e graças ao desenvolvimento de novos materiais e miniaturização
de dispositivos tecnológicos. Por me poder deslocar confortavelmente e em
segurança num veiculo automóvel; por saber que posso encontrar alimentos
perecíveis em bom estado de conservação na prateleira do supermercado. E tudo
isto graças aos materiais que foram desenvolvidos…
Quais são na sua opinião os pontos fortes
deste curso? E os pontos fracos?
Os
pontes fortes deste curso são:
– a
integração de três departamentos (polímeros, mecânica e física) na formação de
um curso superior em engenharia de Materiais. Costumo dizer em tom de
brincadeira que os nossos alunos têm a vantagem de poderem aprender muito mais
do que os alunos de outros cursos, porque têm a possibilidade de interagir com
um vasto número de docentes e investigadores. Dada a forte interação entre os
alunos e docentes/investigadores, na generalidade dos casos há uma proximidade
muito grande na relação entre eles que permite o maior desenvolvimento dos
estudantes em termos intelectuais.
– na
área de ciência e engenharia de materiais o curso tem uma forte componente em
materiais poliméricos, para além do tradicional conhecimento em materiais
metálicos, cerâmicos e vidros. Esta é sem dúvida a vantagem do Mestrado
Integrado em Eng. de Materiais na UMinho, comparativamente às outras
instituições. Isto deve-se ao facto de termos o único departamento em
Engenharia de Polímeros do país nesta Universidade!
– a
integração dos nossos alunos nos centros de investigação associados na
realização de trabalhos cientifico de elevada qualidade que se fomenta nos
últimos anos do curso. Na verdade, estes trabalhos têm sido premiados com
frequência, o último dos quais foi o trabalho de Cristiana Alves, finalista
deste curso em 2013, que venceu o Prémio Ordem dos Engenheiros 2013, atribuído
pela Ordem dos Engenheiros ao melhor trabalho para a indústria de finalistas do
2º ciclo de Ciências e Engenharia de Materiais em Portugal.
As
limitações ou pontos fracos prendem-se com a falta de visibilidade do curso
entre a sociedade que permita cativar alunos para a frequência do mesmo. Por
outro lado, a estrutura curricular definida, apesar de adequada e bem
estruturada, tem um enfoque nos últimos anos letivos virada à investigação
científica e não prevê um período (mínimo de 3 meses) para a realização de estágio
curricular ou projeto de fim de curso em empresa. Por esta razão, penso que o
tecido industrial que nos rodeia não está atento a este tipo de formação e há
existência destes recursos qualificados.
O que caracteriza este curso da UMinho
relativamente aos cursos de Engenharia de Materiais de outras universidades?
A
formação em Engenharia de Materiais existe em várias instituições de ensino
superior do país. Focando apenas no primeiro ciclo de formação, existe a
Licenciatura em Engenharia de Materiais na Universidade de Aveiro (UA), o Mestrado
Integrado em Engenharia Metalúrgica e de Materiais na FEUP e o Mestrado Integrado
em Engenharia de Materiais na FCT-UNL e na UMinho. Os planos curriculares do
curso nestas duas instituições são semelhantes, embora a FCT forneça formação em
materiais celulósicos e papel que é inexistente na UMinho. Por outro lado, a
UMinho tem uma forte formação em materiais poliméricos oriundos do único
departamento de Eng. de Polímeros do País e isto sem competir com o curso de Engenharia
de Polímeros! O curso
nas outras universidades está associado a um único departamento (FEUP – Departamento
de Engenharia Metalúrgica e de Materiais; UA – Departamento de Engenharia de
Materiais e Cerâmica; FCT-UNL – Departamento de Ciência dos Materiais)
especializando-se na área de saber de cada um. Na UMinho caracteriza-se por ser
da responsabilidade de três departamentos distintos (Física, Mecânica e
Polímeros), conferindo uma vantagem enorme ao curso em relação aos outros.
Vejamos, associado a cada um dos departamentos existem os seus centros de
investigação específicos (IPC/I3N, CT2M e CF), dos quais se destacam dois como
centros de investigação de excelência. Estão reunidos num único curso
competências de enorme valor garantindo uma formação de qualidade de quadros
superiores em Engenharia de Materiais.
Existem hoje em dia excesso de profissionais
em determinadas áreas. O que podem esperar os alunos do Mestrado Integrado em
Engenharia de Materiais quanto ao mercado de trabalho?
Os
alunos de MIEMAT podem esperar um vasto mercado de trabalho, não havendo
efetivamente um excesso deste tipo de Engenheiros no mercado. No entanto, dado
o limitado conhecimento do curso pela sociedade e indústria, resulta numa
combinação de aparente dificuldade de integração. Há estatísticas que mostram
que estes Mestres são absorvidos facilmente no mercado e sem dúvida aconteceu
este ano letivo. Alguns dos nossos alunos ainda não tinham terminado a
dissertação e já estavam integrados em empresas, como a Bosch e a Leica. No
entanto, está estatisticamente provado que estes Mestres se integram com
bastante mais facilidade em projetos de investigação os anos após a sua
formação.
Acompanhou o período das reformas de Bolonha,
marcado por uma profunda alteração do modelo de ensino. Como o avalia?
Avalio
de forma positiva o resultado dessa alteração, no entanto nem sempre a sua
implementação teve sucesso, sendo que o objetivo seria o método de ensino por
projeto. No mestrado Integrado em Engenharia de Materiais o ensino por projetos
é efetuado em algumas UCs especificas e UCs de Laboratórios Integrados. No
entanto o forte neste curso é a orientação para projetos de investigação que
decorrem nos centros de investigação associados (IPC/I3N, CT2M e CF). Desde
muito cedo é incutida nos alunos a descoberta por materiais novos, para novas
aplicações ou melhoria de aplicações já existentes. Alguns destes projetos são
mesmo oriundos de problemas reais na indústria e outros são de pura
investigação científica, para desenvolvimento de novos materiais e aplicações
inovadoras. As alterações efetuadas na metodologia de ensino pós Bolonha proporcionaram
ao aluno o desenvolvimento de competências de trabalho em equipa, de
comunicação ora e escrita, da procura constante de informação atualizada, do
desenvolvimento de metodologias mais eficazes para a resolução de problemas,
para além dos conhecimentos teóricos adequados para a sua formação.
Quais são as suas prioridades para o curso
nos próximos tempos?
Uma das
prioridades seria a divulgação do curso através de plataformas que sejam
facilmente acessíveis e apelativas para os jovens de hoje. Esta foi conseguida
muito recentemente, com a iniciativa do Professor Carlos Tavares em criar e
manter um Facebook para Eng. de Materiais na UMinho (www.facebook.com/EngMateriais.UMinho). Outra
prioridade é o estabelecimento de parcerias com o tecido empresarial nacional
de modo a aumentar a oferta de estágios curriculares que possam ser integrados
no âmbito das UCs de Projeto Individual ou Dissertação de Mestrado. Neste
momento este tipo de recurso é muito limitado e é, a meu ver, imprescindível
para a formação dos alunos. Idealmente, culminaria com a criação de um núcleo
de empresas que apoiassem Eng. de Materiais na UMinho e permitisse a fácil
integração dos nossos alunos no mercado de trabalho. Finalmente,
a criação de um núcleo de estudantes de Eng. de Materiais que dinamizasse
atividades extracurriculares de interesse para todos.
Quais os principais desafios?
Motivar
os nossos alunos e ex-alunos a terem voz e serem eles próprios os embaixadores
de Engenharia de Materiais da UMinho. Por isso faço o apelo aos alunos que
divulguem o curso pelos amigos, vizinhos e conhecidos. Aos nossos ex-alunos,
que promovam o curso entre os nossos industriais. Que todos saibam dizer à
sociedade o que é ser Engenheiro de Materiais, para que a população comece a
ter consciência de que tudo o que os rodeia, que não seja criado pela natureza,
foi criado por alguém que pensou, desenvolveu e aplicou um material! Este é um
curso, sem dúvida, de futuro e com futuro! Só não é verdadeiramente conhecido
pela nossa sociedade e pelos nossos industriais, o que eu lamento! Estamos
inseridos numa região designada pelo Vale do Ave e região norte a qual
anteriormente era caracterizada por um tecido empresarial baseado na indústria
têxtil e do calçado. Essa situação alterou-se e hoje podemos encontrar um
tecido empresarial diversificado em áreas muito distintas como metalúrgica,
metalomecânica, transformação de materiais plásticos, reciclagem de materiais,
serviços, centros de investigação. Significa que a Eng. de Materiais na UMinho
encontra um campo muito fértil nesta região, tendo que obrigatoriamente ser
explorada!
Texto: Ana Coimbra
Fotografia: Nuno Gonçalves
(Pub. Mai/2014)
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