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“Penso que, para se ser arqueólogo é preciso primeiro que tudo gostar-se muito deste desafio.”


 

Qual a sua formação e trajeto académico?

Toda a minha formação académica foi obtida na UM.
Licencie-me em História e Ciências Sociais (ensino de), no ano de 1996; em 2001
obtive o grau de mestre em Arqueologia e, em 2008, o doutoramento em
Arqueologia.

Ingressei na UM como monitora no ano letivo 2000/2001,
para dar aulas ao Curso de História, Variante Arqueologia. Entre 2001 e 2008
estive como Assistente, e em 2008 fui contratada como Professora Auxiliar,
situação que mantenho atualmente.

 

Como caracteriza a sua função de diretora de curso?

Desde logo de uma enorme responsabilidade, não só na
coordenação do curso, ao nível do seu funcionamento, mas também da sua
estrutura. Mencionar, por exemplo, o processo de acreditação do curso à Agência
de Avaliação e Acreditação do Ensino Superior (A3ES), que foi um processo de
muita responsabilidade e muito trabalhoso, que se arrastou por muito tempo.
Este processo teve início, mais ou menos em 2010, com a instrução e submissão
do processo. Em 2012 decorreu a submissão do Guião de Autoavaliação e só depois
em janeiro de 2014 decorreu a vista da Comissão Externa de Avaliação. Este
processo acabou, igualmente, por permitir uma restruturação da Licenciatura em
Arqueologia, em 2012. Evidentemente que estes processos contam com o apoio e
envolvimento do corpo docente de arqueologia e também de alguns docentes da
história, sem a colaboração dos quais seriam impossíveis de concretizar. No
entanto, o corpo docente de Arqueologia é bastante reduzido, somos 5 docentes a
100% e 1 a 50%, que asseguramos uma licenciatura, um mestrado e um doutoramento.

Enquanto diretores de curso, temos igualmente de estar sempre
muito atentos e presentes, bem como ser breves nas respostas às solicitações,
que podem ser variadíssimas.

O início e o fim do ano letivo são sempre períodos de
grande envolvimento. Momentos como a receção aos novos alunos ou a eleição dos
delegados e subdelegados requerem um acompanhamento e uma grande proximidade
com os alunos.

Trata-se, de uma função trabalhosa, que requer que
estejamos sempre muito disponíveis. Para além de dar resposta aos chamados assuntos
correntes, que são variadíssimos, é necessário elaborar anualmente o relatório
de autoavaliação do curso, monitorizar o encerramento dos DUCs e Relatórios das
UCs ou providenciar a atualização do catálogo de curso.

O curso de arqueologia tem ainda algumas especificidades,
nomeadamente os estágios práticos que ocorrem para os 3 anos, no mês de Julho.
A distribuição dos alunos pelos diferentes núcleos de estágios é igualmente uma
tarefa assegurada pela direção do curso.

Paralelamente a tudo isto, o diretor de curso,
conjuntamente com a comissão de curso, têm de estar sempre muito atentos de
modo a identificar casos de alunos com eventuais dificuldades económicas,
familiares ou pessoais que tenham repercussões no seu processo de ensino
aprendizagem.

 

O que a motivou a aceitar “comandar” este curso?

Por um lado poder contribuir, mas também retribuir,
dentro das minhas possibilidades, para a manutenção da área disciplinar de
arqueologia dentro da UM, criada por docentes e investigadores que muito admiro
e respeito e aos quais sou devedora enquanto professora, investigadora e
pessoa.

Por outro lado, poder cooperar com um projeto de ensino
no qual acredito, que aposta numa formação abrangente e sólida, de modo a
formar futuros arqueólogos habilitados ao pleno exercício da atividade.

 

As experiencias anteriores têm-na ajudado no cumprimento
da sua função de diretora de curso?

Sim, sem dúvida. Recordo bem o meu primeiro mandato, em
2008, e a quantidade de vezes que telefonava ao anterior diretor de curso, o
Professor José Meireles ou à responsável pela área disciplinar, a Professora
Manuela Martins, a solicitar ajuda na hora de tomar decisões. Situação, aliás,
que por vezes ainda ocorre.

 

Quais são as maiores dificuldades no cumprimento da sua
função?

Ultrapassados os primeiros obstáculos nos anos iniciais
do desempenho das funções de diretora de curso (já vou no 3º mandato) as
maiores dificuldades neste momento prendem-se sobretudo com a adaptação às
novas plataformas digitais da UM, designadamente ao DOC-UM. Devo referir, no
entanto, a ajuda e disponibilidade das funcionárias do Conselho Pedagógico do
ICS, bem como da sua Presidente, nos diferentes tipos de auxílio prestado.

O tempo, por vezes, também é uma dificuldade. Em certos
períodos, conciliar a direção de curso com a docência, a investigação, outras
tarefas de gestão e a vida pessoal torna-se difícil. Todavia, no cumprimento
das minhas funções enquanto diretora de curso, e também a outros níveis, saber
que posso contar com a experiência e o apoio de alguns colegas, designadamente
do diretor de departamento, é muito importante.  

No seu entender, porque é que um futuro universitário
deve concorrer à Licenciatura em Arqueologia?

Um primeiro lugar por gosto – porque gostaria de adquirir
formação na área científica que estuda o passado do homem e das sociedades
através de evidências materiais, procurando compreender o comportamento humano
e o seu significado. Penso que, para se ser arqueólogo é preciso primeiro que
tudo gostar-se muito deste desafio. Depois, porque muito do passado da
humanidade ainda não é conhecido. É preciso continuar a investigar, a fazer
arqueologia, para que o puzzle da história fique cada vez mais completo. Mas a Arqueologia
não se preocupa apenas com as questões do passado, mas também com as questões
do presente e do futuro, procurando dar respostas aos desafios permanentes da
sociedade atual. Na realidade, a importância da Arqueologia enquanto vetor de
desenvolvimento aumentou significativamente nos últimos tempos graças sobretudo
às alterações jurídicas na área patrimonial. Os arqueólogos possuem atualmente
competências genéricas de alto valor social, contribuindo para a melhoria da qualidade
de vida da sociedade, mas também, para a criação e valorização do património. No
caso da UM, situada numa região com um rico património arqueológico e
conhecedora das grandes transformações que visam a sua modernização e a sua
promoção patrimonial e turística, o curso de Arqueologia faz ainda mais
sentido.

 

Quais são na sua opinião os pontos fortes deste curso? E
os pontos fracos?

Os pontos fortes da Licenciatura em Arqueologia da UM são
a aposta numa formação sólida a nível teórico e prático mas também laboratorial
e de campo. De igual modo, a valorização da componente formativa
interdisciplinar no âmbito interno da própria disciplina, mas também ao nível
do interface com outras disciplinas, através de um leque diversificado de UCs
de opção (Geologia, Biologia, Sociologia, Geografia, Antropologia, Línguas). Concede
igualmente um lugar de destaque à formação na área das TIC, quer no contexto do
processo de ensino/aprendizagem (com duas UC obrigatórias na área da
Informática), quer em diferentes contextos da prática arqueológica. Outro dos grandes
pontos fortes, talvez o mais distintivo, é a aposta séria na formação prática
de campo através de 3 UCs obrigatórias de Estágio, que funcionam anualmente, em
regime intensivo, durante o mês de Julho, representando um ensino eminentemente
tutorial, possibilitando a avaliação continuada da aprendizagem, desde a fase
inicial de aquisição de conhecimentos básicos, relativos à prospeção,
escavação, ou levantamentos de arte rupestre, até ao momento de interpretação
do registo arqueológico.  

Os pontos fracos prendem-se com o número reduzido de
docentes. Como já referido, a área disciplinar de arqueologia conta apenas com
5 docentes de carreira, tendo sob a sua responsabilidade 3 cursos. Na
realidade, a ratio de 1/20 é altamente constrangedora, uma vez que a formação
contempla uma forte componente prática, que exige um ensino de caráter
eminentemente tutorial. Também a falta de recursos materiais à disposição do
curso condiciona naturalmente a concretização de alguns dos seus objetivos,
nomeadamente visitas de estudo, internacionalização, entre outros.


O que caracteriza este curso da UMinho relativamente aos
cursos da Licenciatura em Arqueologia de outras universidades?

Se compararmos a estrutura curricular da Licenciatura em
Arqueologia da UM com o plano de estudos dos cursos oferecidos pelas outras
universidades facilmente se evidenciam as diferenças, sobretudo relativamente
aos pontos fortes enunciados anteriormente. Entre esses, sem dúvida que uma das
grandes diferenças, que para nós é basilar, é a formação de campo e
laboratorial. Nenhuma outra universidade oferece estágios práticos de campo,
componente que para nós é imprescindível para a formação de um futuro arqueólogo.

Na realidade, a Licenciatura em Arqueologia da UM
beneficia de um conjunto de recursos materiais e parcerias de apoio que o tornam
singular. Refiro-me, concretamente, à colaboração continuada com a Unidade de
Arqueologia da Universidade e com o Museu de Arqueologia D. Diogo de Sousa,
para apoiar o projeto de ensino e o completar em termos materiais (bibliotecas,
laboratórios) e humanos. Sem dúvida que, a possibilidade dos alunos poderem
acompanhar e/ou integrar os trabalhos arqueológicos que a UAUM assegura,
representa um acesso privilegiado a um verdadeiro laboratório de campo. O apoio
do corpo de técnicos e investigadores da UAUM é bastante amplo, quer seja em
termos da formação no domínio dos Estágios Práticos quer na formação
especializada na área das TICs. Situação idêntica se verifica nos domínios da
conservação e restauro, através da parceria com o MADDS. Igualmente distintivo
tem sido a política de celebração de protocolos desenvolvida, nomeadamente com
diversas autarquias locais do norte de Portugal, que permite designadamente
apoiar a realização dos estágios práticos de campo.

 

Existem hoje em dia excesso de profissionais em
determinadas áreas. O que podem esperar os alunos da Licenciatura em
Arqueologia quanto ao mercado de trabalho?

O mercado de trabalho na área de Arqueologia não é
diferente da esmagadora maioria das demais aéreas, nem, obviamente, indiferente
à situação económica que o país atravessa.

Se atendermos às estatísticas, o desemprego dos
licenciados em Arqueologia pela UM é muito mais baixo do que os do restante
país. Os dados apontam para taxas de desemprego na ordem dos 15% para o país e
de 7% para os diplomados em Arqueologia da UM.

No entanto, é preciso ser realista. Tal como nas outras
áreas, a competitividade é cada vez maior. Os primeiros anos serão sempre de
alguma instabilidade, mas à medida que o seu currículo se solidifica, e também
dependendo do tipo de área, penso que continuam a existir boas oportunidades de
emprego. Igualmente, a reabilitação económica do país será extremamente
importante para a integração dos futuros arqueólogos. 


Quais são os maiores desafios de um recém-licenciado em
Arqueologia?

Os arqueólogos podem exercer a sua atividade nos mais
diversos meios, nomeadamente em organismos da administração local e central
(nas áreas da pesquisa, salvaguarda e gestão patrimonial), em museus, em
empresas privadas de intervenção especializada no domínio da arqueologia, em
empresas ligadas às indústrias culturais, ou no exercício de profissão liberal.

No entanto, os seus maiores desafios serão sempre
adquirir currículo e desenvolver competências transversais de modo a poder ser
mais competitivos e criativos, adaptando-se as exigências da sociedade e do
mercado de trabalho.


Texto: Ana Coimbra     

Fotografia: Nuno Gonçalves


(Pub. Out/2015)

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