
Artigo de opinião – BRT no Campus de Gualtar: Uma oportunidade histórica que se vai perder
João Miguel Fernandes, Professor catedrático da Escola de Engenharia ⠿ 18-06-2025 17:00
1.
Atualmente, o Campus de Gualtar (CG) está centrado na mobilidade automóvel. É fácil entrar no CG (sul, norte, este) e estacionar nos 1700 lugares disponíveis, a que acresce um preço de estacionamento muito baixo. Também não há restrições à circulação, pois pode estacionar-se junto a qualquer edifício. Até os táxis entram no CG. Já os autocarros, apesar de outrora o terem feito, estão impedidos de fazê-lo, com o argumento que a paragem fora do CG é cómoda. Não é.
2.
Uma visão moderna e sustentável da mobilidade obriga a que esta realidade seja mudada. Tem que ser dada prioridade absoluta ao transporte coletivo. A instalação de uma linha de BRT junto ao CG, idealmente atravessando-o, devia constituir uma oportunidade para ajudar a concretizar essa mudança. Trata-se de mais uma alternativa de mobilidade a funcionar na maioria do percurso em canal dedicado e com alta frequência (a cada seis minutos). Porém, o sucesso do BRT depende de outros fatores, nomeadamente da paragem em locais convenientes, i.e., próximos dos pontos de interesse dos utilizadores.
3.
Infelizmente, a reitoria, à proposta dos TUB que sugere o BRT a passar pelo meio do CG, contrapropôs um percurso pela periferia e a atravessar a floresta que existe atrás da cantina. É muito clara a visão que a reitoria tem para o transporte público. Deseja-o longe do CG, para que este continue reservado para o automóvel. O percurso periférico é pior que o interior, pois (1) demora mais tempo; (2) é mais caro de construir; (3) deixa os utentes mais longe dos seus locais de destino. O BRT no meio do CG é seguro. Há muito maior risco de sinistralidade com 3.000 carros diariamente no CG do que com oito motoristas profissionais a circular em canal dedicado a velocidades moderadas, com inúmeras medidas mitigadoras de velocidade e sistemas ativos de segurança e de prioridade, para os peões e para o próprio BRT. Porém, o mais grave desta solução é a construção de uma estrada no meio de uma das poucas zonas verdes do CG. É ridículo pensar nesta ideia, quanto mais propô-la. A área fica irremediavelmente comprometida para qualquer utilização de laser ou desportiva. As obras vão ser pesadas e caras, pois o terreno é acidentado, cheio de rochas.
4.
A Reitoria pretende que nada mude. Os impactos no CG serão mínimos para os carros e, para tal, propõe-se até a destruição da floresta. Se as condições para os não-automobilizados nada/pouco melhorarem, é muito óbvio que não vai haver uma significativa transferência modal.
5.
O BRT sozinho não vai alterar os hábitos de mobilidade dos utilizadores do CG. O BRT tem de ser complementado com a promoção de outros modos de transporte (coletivo, pedonal, ciclável) e a sua integração. O CG precisa de acolher autocarros urbanos e intermunicipais, fator que, para mim, é premente. É pena que a UM não saiba aproveitar o BRT para promover uma verdadeira mudança na mobilidade e tornar-se uma universidade interligada, aberta, dinâmica. Prefere manter-se entrincheirada, fechada, parada. A oportunidade era histórica, mas a UM não soube agarrá-la. Tudo isto era expectável, pois a reitoria mantém vários carros com motorista para seu usufruto e reserva inúmeros espaços para parquear no CG. Quem só anda de carro, como vai perceber as necessidades dos que se deslocam de autocarro, a pé ou de bicicleta?
Atualizado a 18-06-2025 17:00